Associação de fãs do Festival RTP da Canção
e do Festival Eurovisão da Canção
O ESC move paixões e é impossível passar indiferente face a um evento de tal dimensão. Há mesmo quem o compare às grandes competições de futebol e ao poder que ambos têm de agregar pessoas e despertar reações acesas. Há ainda quem pense que o Festival RTP da Canção não tem o mesmo impacto, mas a verdade é que, à sua escala, o Festival desperta também o interesse não só daqueles que se assumem fãs, mas de uma grande parte dos telespectadores portugueses – ou não fosse ele o concurso mais antigo da televisão portuguesa. Pedimos a cinco sócios que partilhassem a sua opinião relativamente ao Festival RTP da Canção e, como sempre (felizmente), as opiniões dividem-se.
Para Bruno Carvalho (Chaves), esta “edição foi boa sob o ponto de vista da diversidade musical, mas muito fraca em termos de composição (letra e música).” Por isso, defende algumas mudanças: “Penso que a RTP deve rever o formato e dar a oportunidade a todos aqueles que quiserem compor para a próxima edição, sem ser apenas por convite. Defendo um formato em que a RTP convidasse 10 compositores e o público, através de votação, com acesso às versões completas, escolhesse outras 10, sendo distribuídas equitativamente por duas semifinais.”
Por seu turno, Marco Lopes (Loulé) assume que tem uma opinião “dissonante e antagónica”, esclarecendo: “Se por um lado me agrada a ideia de rejuvenescimento, a aproximação do festival a mais pessoas, quase sempre com pelo menos um terço de compositores/ autores/intérpretes que são mainstream em Portugal, por outro, o rejuvenescimento facilmente pode incorrer em novo mofo, pelo que deve ser constante. Desde 2017 que o formato estagnou o que, no fundo, o faz aproximar-se daquilo que sempre foi até esse ano.” Este sócio aponta que ao Festival ainda “falta diversidade e despojamento de intelectualidade, isto porque as massas gostam de alguns dos autores convidados, mas uma outra falange (ou outras) de portugueses e fãs (que também são massivos) não estão representados. E assim, muito embora não tenhamos de ser iguais aos demais, raramente poderemos arriscar com uma entrada arrojada, festiva, propensa a dança e fogo de artifício.”. Marco resume, afirmando: “a boa base foi lançada – façam-se, agora, os ajustes sem receios do ridículo.”
Já Duarte Cid (Lisboa) começa por esclarecer: “Nunca fui grande fã do nosso FC, no entanto, assumo que é incontornável para um fã como eu. Ainda mais porque acompanho as finais nacionais da maioria dos países e fico com muitas das músicas que ficam pelo caminho. Mas como Santos da casa não fazem milagres, as nossas finais nacionais são das que menos me estimulam... No entanto, não vivia sem elas. É aquele sentimento português, de dizer que é tudo uma miséria, mas não deixar de ver...” Duarte considera que o “FC ganhou um glamour que conheci nos finais dos anos 80, em que o nosso FC tinha prestígio e marcava carreiras]”. Por essa razão, considera que o Festival “está no bom caminho”. No entanto, tal como Marco Lopes, gostaria de ver algumas alterações no sistema de seleção dos autores a concurso: “acho que deveria haver um sistema misto, entre autores convidados e uma participação mais alargada aberta a concurso e não só uma canção, o que no meu entender é além de tudo redutor.”. Ainda no que respeita às canções concorrentes, assinala as melhorias: “Acho que o festival como espetáculo, melhorou. Acho que a ideia das duas semifinais é também boa e louvável e acho ainda que tem havido alguma melhoria na qualidade das músicas”, mas aponta também para alterações que gostaria de ver: “acho que deveriam ser mais as participações nas semifinais, (10), passando 5 em cada semifinal.”. Para Duarte, o ponto menos positivo vai para os “números entre espetáculos”, considerando-os “verdadeiramente deprimentes e dignos de dó!”. Este sócio termina com uma nota positiva: “Mas, enfim, o saldo é positivo mesmo assim, e digo isto porque este ano pela primeira vez na vida e, por insistência de um amigo, assisti pela primeira vez ao vivo ao nosso FC.”
Pedro Ferraz (Lisboa) explica que este ano não pôde acompanhar o Festival em direto, mas afirma: “não posso dizer que tenha ficado com pena, porque estaria a mentir”. Pedro afirma-o considerando o seu gosto musical: “No geral, as canções deste ano (para o meu gosto) variaram entre o péssimo, o mau e o muito mau.
É inquestionável que os artistas/compositores convidados têm talento, dentro do seu género, mas continuam a apresentar canções que não são competitivas para o ESC.”. No seu entender, o modelo do Festival RTP da Canção deveria ser repensado e alterado, afirmando: “É verdade que a RTP acertou um ano, (acertou a RTP ou a Luísa Sobral?) com esta fórmula, mas um ano não pode fazer a regra, antes, é a exceção.”. Neste sentido, aponta para alguns aspetos que gostaria de ver alterados, comparando o modelo português com outros congéneres europeus: “Não creio que faça sentido não repetir artistas e compositores (o que seria um San Remo ou um Melodifestivalen se os compositores e os artistas só pudessem participar um ano?). Este modelo de FC parece estar orientado apenas para os novos talentos ou para compositores aclamados pela crítica, mas que o grande público não ouve – creio mesmo que a maioria dos nomes quase ninguém conhece. Claro que aplaudo o facto de a RTP usar o FC para lhes dar voz, o que não concordo é que o FC se resuma a isso. (O que seria um Melodifestivalen ou um San Remo se só participassem os novos artistas?).” Para Pedro, no entanto, existe outra coisa que o desagrada ainda mais: “Mas se há algo que me tira do sério neste modelo de FC, são os compositores que são convidados por se terem destacado num determinado estilo e resolvem levar ao FC algo completamente diferente daquilo que fazem. Faz sentido uma Rita Red Shoes levar ao FC uma canção em português, quando foi precisamente o cantar em inglês aquilo que lhe deu notoriedade e que em parte contribuiu para o facto de ela ser convidada? Ou uma Capicua apresentar uma balada que pode parecer muitas coisas, mas que seguramente não é uma canção que alguém associe ao seu autor?”. Apesar destes pontos que gostaria de ver alterados, Pedro conclui: “Dito isto, que continue o FC (nem que seja pela tradição), mas talvez seja hora de o repensar. Às vezes mudar é bom. E depois de termos ficado nos últimos lugares em 2018 e 2019, é tempo de voltar a sonhar com uma passagem à final...” A opinião de Vasco Teixeira (Porto) é distinta: “Na minha opinião, o modelo adotado para o FC em 2017 permite uma qualidade global muito interessante. Elege músicas candidatas ao ESC que podem não ter muito sucesso lá, mas que são representações dignas da quais nos podemos orgulhar. Recuperou visibilidade, credibilidade e conquistou uma nova ‘fatia’ de espectadores, que ignoravam por completo o FC e, provavelmente, só o viam como motivo de gozo.” Porém, Vasco assume que, ainda assim, existem alguns elementos que deverão ser corrigidos, afirmando: “Sei que é complicado convidar autores (ou aceitar vencedores de concursos de rádio) e depois não lhes dar liberdade total para escolherem artistas ou encenação, mas não podem ser permitidas situações como as que ocorreram este ano, com intérpretes com um nível de amadorismo constrangedor] Tem de haver algum poder de acompanhamento e aconselhamento para evitar que os autores escolham filhos, amigos, etc., que não se adequam minimamente ao nível do festival.”. No que respeita ao estilo musical, Vasco considera que, “se, por um lado, acho interessante que os autores se restrinjam ao seu tipo de música habitual (por isso são convidados, por terem um determinado lugar próprio na nossa cena musical), é preciso fazê-los entender o que é o FC, qual o objetivo (ganhar, para estar no ESC) e o que é o ESC (muitos não conhecem minimamente a qualidade geral que lá se pratica hoje em dia em termos de composição, produção e interpretação).”. Na opinião de Vasco, “Tem de haver diversidade verdadeira (de géneros, de ritmos) mas sempre com uma qualidade mínima.”
As opiniões poderão ser divergentes e trazer ideias distintas, mas é unânime o entusiasmo relativamente ao Festival RTP da Canção e o seu lugar enquanto programa de televisão com uma larga tradição em Portugal.